2007/03/26

A estratégia da tensão
O terrorismo não reinvindicado da NATO por Silvia Cattori*

Daniele Ganser, professor de história contemporânea na universidade de Basileia e presidente da ASPO-Suíça, publicou um livro de referência sobre os "Exércitos secretos da NATO" . Segundo ele os Estados Unidos organizaram na Europa Ocidental durante 50 anos atentados que atribuíram mentirosamente à esquerda e à extrema esquerda para as desacreditar aos olhos dos eleitores. Esta estratégia continua hoje em dia para criar o temor do Islão e justificar as guerras do petróleo.

Silvia Cattori: A sua obra consagrada aos exércitos secretos da NATO [1] explica o que é a estratégia da tensão [2] e o grande perigo dos terrorismos bandeira-falsa [3] . O livro mostra-nos como a NATO durante a Guerra Fria – em coordenação com os serviços de informação dos países europeus ocidentais e com o Pentágono – serviu-se de exércitos secretos, recrutou espiões nos meios da extrema direita e organizou actos terroristas que foram atribuídos à extrema esquerda. Sabendo isso, podemo-nos interrogar sobre o que se possa passar hoje em dia sem nós o sabermos.

Daniele Ganser: É muito importante compreender o que a estratégia da tensão realmente é e como funcionou durante esse período. Isso poder-nos-á ajudar a esclarecer o presente e a ver melhor em que medida ela está hoje em dia ainda em funcionamento. Pouca gente sabe o que a expressão estratégia da tensão significa. Por isso é importante falar dela e explicar o que significa. É uma táctica que consiste em cometer atentados criminosos com as próprias mãos e atribuí-los a um outro qualquer. A palavra tensão refere-se à tensão emocional, àquilo que cria um sentimento de medo. A palavra estratégia refere-se ao que alimenta o medo das pessoas em relação a um certo grupo. As estruturas secretas da NATO eram equipadas, financiadas e treinadas pela CIA, em coordenação com o MI6 (os serviços secretos britânicos) para combater as forças armadas da União Soviética em caso de guerra, mas também, segundo as informações de que hoje se dispõe, para cometer atentados terroristas em diversos países [4] . Foi assim que, nos anos 70, os serviços secretos italianos utilizaram exércitos secretos para cometerem atentados terroristas com o fim de provocar o medo na população e depois acusar os comunistas de terem sido os autores. Foi isto numa altura em que o Partido Comunista tinha um poder legislativo importante no Parlamento. A estratégia de tensão tivera por fim desacreditá-lo e enfraquecê-lo, para impedí-lo de poder chegar ao poder executivo.

Silvia Cattori: Saber o que significa é uma coisa. Mas continua a ser difícil acreditar que os nossos governos tenham podido deixar a NATO, os serviços de informação europeus ocidentais e a CIA ameaçar a segurança dos seus próprios cidadãos!

Daniele Ganser: A NATO estava no coração dessa rede clandestina ligada ao terror; o Clandestine Planning Committee (CPC) e o Allied Clandestine Committee (ACC), que estão hoje perfeitamente identificados, eram subestruturas clandestinas da Aliança Atlântica. Agora, ainda que tudo isso seja já bem conhecido, continua a ser difícil saber quem fazia o quê. Não há documentos que mostrem quem comandava, quem organizava a estratégia da tensão, como a NATO, os serviços de informação europeus ocidentais, a CIA, o MI6 e os terroristas recrutados nos meios da extrema direita distribuíam os papéis. A única certeza que temos é que havia, no interior dessas estruturas clandestinas, elementos que utilizaram a estratégia da tensão. Os terroristas de extrema direita explicaram nas suas deposições que foram os serviços secretos e a NATO que os haviam apoiado nessa guerra clandestina. Mas quando se pede explicações a membros da CIA ou da NATO - coisa que fiz durante vários anos - limitam-se a dizer que talvez possa ter havido alguns elementos criminosos que tenham escapado ao seu controlo.

Silvia Cattori: Esses exércitos secretos estavam activos em todos os países europeus ocidentais?

Daniel Ganser: Com as minhas pesquisas consegui provar que esses exércitos secretos existiam, não apenas em Itália, mas em toda a Europa Ocidental: na França, na Bélgica, nos Países Baixos, na Noruega, na Dinamarca, na Suécia, na Finlândia, na Turquia, na Espanha, em Portugal, na Áustria, no Luxemburgo, na Alemanha. Ao princípio pensava-se que houvesse uma estrutura de guerrilha única e que, portanto, todos esses exércitos tivessem participado na estratégia de tensão, logo em atentados terroristas. Ora, é importante saber que nem todos esses exércitos secretos participaram em atentados e compreender o que os diferenciava, porque eles tinham duas actividades distintas. O que parece hoje claro é que as estruturas clandestinas da NATO, no conjunto chamadas Stay Behind [5] , estavam concebidas à partida para levar a cabo guerrilhas em caso de ocupação da Europa Ocidental por parte da União Soviética. Os Estados Unidos diziam que essas redes de guerrilha eram necessárias para colmatar a impreparação em que se encontraram os países invadidos pela Alemanha.

Um certo número de países que sofreram a ocupação alemã, como a Noruega, queriam tirar lições da sua incapacidade demonstrada de resistir ao ocupante e disseram a si próprios que, em caso de nova ocupação, deveriam estar mais bem preparados e ter um exército secreto como segunda opção, se porventura o exército clássico ficasse desfeito. Havia nesses exércitos secretos gente honesta, patriotas sinceros que queriam simplesmente defender o seu país em caso de ocupação.

Silvia Cattori: Se bem compreendo, esses Stay Behind cujo objectivo inicial era preparar-se para a eventualidade duma invasão soviética foram desviados dele para combater a esquerda. Custa a perceber porque razão os partidos de esquerda não investigaram, não denunciaram esses desvios mais cedo?

Daniele Ganser: Se se tomar o caso da Itália, parece que, de cada vez que o Partido Comunista interpelou o governo pedindo explicações sobre o exército secreto que operava no país com o nome de código Gladio [6] , nunca teve resposta sob o pretexto de segredo de Estado. Não é senão em 1990 que Giulio Andreotti [7] reconheceu a existência do Gladio e das suas ligações com a NATO, a CIA e o MI6 [8] . É nessa época também que o juiz Felice Casson conseguiu provar que o verdadeiro autor do atentado de Peteano em 1972, que abalou toda a Itália e que fora até então atribuído a militantes da extrema esquerda, era de facto Vincenzo Vinciguerra, próximo do Ordine Nuovo, um grupo de extrema direita. Vinciguerra confessou haver cometido o atentado de Peteano com a ajuda dos serviços secretos italianos. Vinciguerra falou também da existência desse exército secreto Gladio e explicou como, durante a Guerra Fria, esses atentados clandestinos causaram a morte de mulheres e crianças [9] . Afirmou também que esse exército secreto, controlado pela NATO, tinha ramificações por toda a Europa. Quando apareceu essa informação houve uma crise política em Itália. E é graças às investigações do juiz Felice Casson que se tem hoje conhecimento dos exércitos secretos da NATO.

Na Alemanha quando os socialistas do SPD souberam, em 1990, que existia no seu país - como em todos os outros países europeus - um exército secreto, e que essa estrutura estava ligada aos serviços secretos alemães, bradaram escândalo aos quatro ventos e acusaram o partido democrata-cristão (CDU). Este reagiu dizendo: se nos acusais, vamos a público dizer como vós também, com Willy Brandt, participastes na conspiração. Coincidiu isto com as primeiras eleições na Alemanha reunificada, que o SPD esperava ganhar. Os dirigentes do SPD compreenderam que isso não seria um bom tema eleitoral e acabaram por dar a entender que, no fim de contas, esses exércitos secretos eram justificáveis.

No Parlamento Europeu, em Novembro de 1990, levantaram-se vozes dizendo que não se podia tolerar a existência de exércitos clandestinos, nem deixar por explicar os actos de terror cuja verdadeira origem não era clara e que era necessário investigar. O Parlamento Europeu protestou na altura por escrito junto da NATO e do presidente George Bush senior. Mas nada foi feito.

Só na Itália, Suíça e Bélgica foram levados a cabo inquéritos públicos, e só nestes países se pôs um pouco de ordem neste assunto e se publicou relatórios sobre os exércitos secretos.

Silvia Cattori: E hoje em dia? Esses exércitos clandestinos estarão ainda activos? Haverá estruturas nacionais secretas que escapem ao controlo dos Estados?

Daniele Ganser: Para um historiador é difícil de responder a essa questão. Não se dispõe dum relatório oficial país por país. Nas minhas obras analiso factos que posso provar.

Em relação à Itália, existe um relatório que afirma que o exército secreto Gladio foi suprimido. Sobre a existência do exército secreto P26 na Suíça, houve, em Novembro de 1990, semelhante relatório do Parlamento. Assim, os exércitos clandestinos que armazenaram explosivos em esconderijos um pouco por toda a Suiça foram dissolvidos.

Mas nos outros países não se fez nada. Em França quando o presidente François Mitterrand afirmou que tudo isso pertencia ao passado, soube-se logo a seguir que essas estruturas secretas continuavam activas com a afirmação de Giulio Andreotti que o presidente francês mentia: "Diz o senhor que os exércitos secretos já não existem; ora, aquando da reunião secreta no Outono de 1990, vós também franceses estáveis presentes; não diga portanto que já não existem". Mitterrand ficou bastante zangado com Andreotti pois, após esta revelação, foi obrigado a rectificar a sua declaração. Mais tarde, o antigo chefe dos serviços secretos franceses, o almirante Pierre Lacoste, confirmou que esses exércitos secretos existiam também em França e que a França estivera também implicada em atentados terroristas [10] .

É portanto difícil dizer se tudo isso está acabado. E, ainda que as estruturas Gladio tenham sido dissolvidas, pode-se sem dúvida ter criado outras, continuando-se a servir desta técnica da estratégia da tensão e das bandeiras-falsas.

Silvia Cattori: Pode-se pensar que, após a derrocada da URSS, os Estados Unidos e a NATO tenham continuado a aplicar a estratégia da tensão e as bandeiras-falsas em outras frentes?

Daniele Ganser: As minhas pesquisas concentraram-se sobre o período da Guerra-fria na Europa. Mas sabe-se que, em outros sítios, houve bandeiras-falsas cuja responsabilidade provou-se ter sido dos Estados Unidos. Um exemplo: os atentados em 1953 no Irão, no princípio atribuído aos comunistas iranianos. Ora ficou comprovado que a CIA e o MI6 se serviram de agentes provocadores para orquestrar a queda o governo de Mohamed Mossadegh. Isto no quadro da guerra pelo controlo do petróleo. Outro exemplo: os atentados no Egipto em 1954 que ao princípio se atribuía aos muçulmanos. Ficou mais tarde provado, naquilo que se chama o caso Lavon [11] , que foram agentes da Mossad os autores. Neste caso tratou-se de Israel conseguir que as tropas britânicas não saíssem do Egipto para garantir a segurança de Israel. Assim, temos exemplos históricos que mostram que a estratégia da tensão e as falsas-bandeiras foram utilizadas pelos EUA, Grã Bretanha e Israel. É preciso continuarmos as pesquisas nestas áreas porque, na sua história, outros países utilizaram também a mesma estratégia.

Silvia Cattori: Estas estruturas clandestinas da NATO, criadas depois da Segunda Guerra Mundial por iniciativa dos Estados Unidos para dotar os países europeus duma guerrilha capaz de resistir a uma invasão soviética, no fim de contas não serviram para mais nada que levar cabo acções criminosas contra os cidadãos europeus! Tudo leva a crer que os Estados Unidos tinham afinal outros objectivos.

Daniele Ganser: Tem razão em levantar essa questão. Os Estados Unidos estavam interessados no controlo político. Esse controlo político é um elemento essencial da estratégia de Washington e Londres. O general Geraldo Serravalle, chefe do Gladio, a rede italiana do Stay Behind, dá um exemplo disso no seu livro. Ele conta que compreendeu que os Estados Unidos não estavam interessados na preparação dessa guerrilha em caso de invasão soviética quando viu que, o que interessava aos agentes da CIA que assistiam aos exercícios de treino do exército secreto que ele dirigia, era assegurar que esse exército funcionasse de modo a controlar as acções dos militantes comunistas. O medo deles era a subida ao poder dos comunistas em países como a Grécia, a Itália ou a França. Era portanto para isso que servia a estratégia da tensão: orientar e influenciar a política de certos países da Europa Ocidental.

Silvia Cattori: Disse que o elemento emocional é um factor importante na estratégia da tensão. Portanto, o terror, cuja origem é ainda vaporosa e incerta, e o medo que ele provoca, servem para manipular a opinião. Ontem ateava-se o medo do comunismo; hoje não se ateia o medo do Islão?

Daniele Ganser: Sim, há um paralelo bem claro. Como preparação da guerra contra o Iraque disse-se que Sadam Hussein possuía armas biológicas, que havia um elo entre o Iraque e os atentados de 11 de Setembro, ou que havia um elo entre o Iraque e os terroristas da Al Qaida. Mas nada disso era verdade. Com essas mentiras pretendia-se fazer crer ao mundo que os muçulmanos queriam estender o terrorismo por todo o lado e que essa guerra era necessária para combater o terror. Ora, a verdadeira razão da guerra é o controlo dos recursos energéticos. A geologia determinou que as riquezas em gás e petróleo se concentrem nos países muçulmanos. Quem os queira açambarcar tem de se esconder atrás deste género de manipulações.

Eles não podem dizer às pessoas que já não há muito mais petróleo, e que o máximo da produção global – o "peak oil" [12] – dar-se-á provavelmente antes de 2020; nem que é preciso ir buscá-lo ao Iraque; porque isso seria dizerem que é necessário matar crianças por petróleo. E têm razões para não quererem dizer tal coisa. Também não podem dizer às pessoas que no Mar Cáspio há reservas enormes e que têm planos para construir um oleoduto até ao Oceano Índico, e que, como não se pode passar pelo Irão ao sul, nem pela Rússia ao norte, será necessário passar por leste, pelo Turquemenistão e pelo Afeganistão, e que é portanto necessário controlar esses países. Por isso se qualifica os muçulmanos de "terroristas". Não são senão grandes mentiras, mas se forem repetidas vezes sem conta, as pessoas acabarão por crer nelas e na utilidade das guerras antimuçulmanas; assim como esquecerão que há muitas formas de terrorismo, e que a violência não é uma especialidade apenas muçulmana.

Silvia Cattori: Em suma, essas estruturas clandestinas poderiam ter sido dissolvidas, mas a estratégia da tensão pode ter continuado?

Daniele Ganser: Exacto. Pode-se ter dissolvido essas estruturas mas formadas outras novas. É preciso explicar como são a táctica e a manipulação na estratégia da tensão. Nada disso é legal. Mas para os Estados é mais fácil manipular as pessoas que dizer-lhes que se está tentando deitar mão ao petróleo alheio. De qualquer modo, nem todos os atentados provêem da estratégia da tensão. Mas é difícil saber quais são os manipulados e quais não são. Mesmo quem saiba que um certo número de atentados é manipulado por Estados para desacreditar um inimigo político, esbarra contra um obstáculo psicológico. Após um atentado as pessoas têm medo, estão confusas. É muito difícil ter ideia que a estratégia da tensão, a estratégia da bandeira-falsa, é uma realidade. É mais fácil aceitar a manipulação e dizer a si próprio: "Há trinta anos que me mantenho informado e nunca ouvi falar de exércitos criminosos nenhuns. Os muçulmanos atacam-nos, e é por isso que os combatemos."

Silvia Cattori: Desde 2001 a União Europeia instaurou medidas antiterroristas. Mais tarde tornou-se evidente que essas medidas permitiram à CIA raptar pessoas e transportá-las para sítios secretos para as torturar. Os Estados europeus não se tornaram um pouco reféns da sua submissão aos Estados Unidos?

Daniele Ganser: Os Estados europeus tiveram uma atitude bastante fraca em relação aos Estados Unidos após os atentados de 11 de Setembro de 2001. Depois de terem afirmado que as prisões secretas eram ilegais, deixaram de intervir. E o mesmo fizeram com os prisioneiros de Guantânamo. Na Europa levantaram-se vozes afirmando: "Não se pode privar os prisioneiros de defesa e de advogado." Mas quando Madame Angela Merkel levantou esta questão, os Estados Unidos deixaram claramente entender que a Alemanha estava de certo modo implicada no Iraque e que os seus serviços secretos haviam contribuído para a preparação dessa guerra e que portanto deveriam manter-se calados.

Silvia Cattori: Em tal contexto, com tantas zonas de sombra, que segurança traz a NATO aos povos que se presume proteger, permitindo desta maneira aos serviços secretos manipular?

Daniele Ganser: Em relação aos atentados terroristas manipulados pelos exércitos secretos da rede Gladio durante a Guerra-fria é preciso determinar com clareza qual foi a implicação real da NATO neles e saber o que realmente se passou. Trataram-se de actos isolados ou organizados secretamente pela NATO? Até hoje a NATO tem sempre recusado falar da estratégia da tensão e do terrorismo durante a Guerra-fria. A NATO rechaça qualquer questão relativa ao Gladio.

Hoje em dia a NATO é usada como um exército ofensivo, mas não foi para isso que a organização foi criada. Foi activada dessa maneira no dia 12 de Setembro de 2001, imediatamente após os atentados em Nova Iorque. Os dirigentes da NATO afirmam que a razão da sua participação na guerra contra os afegãos é combater o terrorismo. Ora a NATO está em risco de perder essa guerra. Haverá então uma grande crise, debates; o que virá a permitir saber se a NATO conduz, tal como diz, uma guerra contra o terrorismo, ou se se encontra numa situação análoga à que se encontrava durante a Guerra Fria com o exército secreto Gladio, onde tinha uma ligação ela própria com o terror. Os próximos anos dirão se a NATO age para além da missão para que foi fundada: defender os países europeus e os Estados Unidos em caso de invasão soviética, evento que nunca se deu. A NATO não foi fundada para se apoderar do petróleo e do gás dos países muçulmanos.

Silvia Cattori: Percebe-se porque Israel, a quem interessa aumentar os conflitos nos países árabes e muçulmanos, encoraja os Estados Unidos nesse sentido. Mas que interesse possa ser o dos Estados europeus em enviar tropas para guerras decididas pelo Pentágono, como no Afeganistão, por exemplo?

Daniele Ganser: Penso que a Europa esteja confusa. Os Estados Unidos são presentemente os senhores da força e os Europeus têm tendência a pensar que o melhor a fazer é colaborar com o mais forte. Mas é bom pensar um pouco melhor. Os parlamentares europeus cedem facilmente à pressão dos Estados Unidos, os quais reclamam continuamente tropas para esta ou aquela frente. Quanto mais os países europeus cederem, tanto mais se submeterão, e tanto mais se confrontarão com problemas cada vez maiores. No Afeganistão, os alemães e os britânicos estão sob o comando do exército americano. Estrategicamente não é uma posição do interesse desses países. Recentemente os Estados Unidos mandaram os alemães dispor as suas tropas também no sul do Afeganistão em zonas onde as batalhas são mais duras. Se os alemães aceitarem, arriscam-se a serem massacrados pelas forças afegãs, que rejeitam a presença de qualquer ocupante que seja. A Alemanha deveria, com toda a seriedade, perguntar-se se não deveria retirar os seus 3000 soldados do Afeganistão. Mas, para os alemães, desobedecer às ordens dos Estados Unidos, de quem são um pouco como vassalos, é um passo difícil a dar.

Silvia Cattori: Que sabem as autoridades que nos governam hoje em dia da estratégia da tensão? Continuarão a permitir aos fazedores de guerras fomentarem golpes de Estado, raptarem e torturarem pessoas, sem nada fazer? Têm as autoridades ainda os meios necessários de os impedir de levar a cabo tais crimes?

Daniele Ganser: Não sei. Como historiador, observo, tomo notas. Como conselheiro político, afirmo sempre que há que não ceder a manipulações cuja ideia é criar o medo e a fazer crer que os "terroristas" são sempre os muçulmanos; afirmo que se trata duma luta pelos recursos energéticos; que é preciso encontrar formas de sobreviver à penúria energética sem ser no sentido da militirização. Não se pode resolver os problemas de tal jeito; assim só se agravam.

Silvia Cattori: Ao observar a diabolização dos árabes e dos muçulmanos na perspectiva do conflito israelo-palestiniano, diz-se que não tem nada a ver com o petróleo.

Daniele Ganser: Sim, nesse caso, sim. Mas na perspectiva dos Estados Unidos trata-se de facto de controlar as reservas energéticas do bloco euroasiático que se situa na "elipse estratégica" que vai do Azerbaijão, passando pelo Turquemenistão e o Cazaquistão até à Arábia Saudita, o Iraque, o Kuwait e o Golfo Pérsico. É precisamente aí, nessa região, onde se desenrola toda a pretensa guerra "contra o terrorismo", que se concentram as mais importantes reservas de petróleo e gás. Na minha opinião, tudo isto não é mais do que um jogo geoestratégico no qual a União Europeia não pode senão perder. Porque se os Estados Unidos chegam a controlar esses recursos, e com o agravamento da crise energética, aí estarão eles a dizer: "Quereis gás? quereis petróleo? Pois sim, mas em troca nós queremos isto e aquilo." Os Estados Unidos não darão de graça petróleo e gás aos países europeus. Pouca gente sabe que o "peak oil", o máximo de produção, já foi atingido no Mar do Norte, e que, consequentemente, a produção de petróleo na Europa - a produção da Noruega e da Grã Bretanha - está em declínio.

No dia em que as pessoas se derem conta que estas guerras "contra o terrorismo" são manipulação, e que as acusações contra os muçulmanos são em parte propaganda, ficarão bastante surpreendidas. Os Estados europeus têm que acordar e compreender por fim como funciona a estratégia da tensão. E têm que aprender também a dizer não aos Estados Unidos. Além disso, nos Estados Unidos também há muita gente que não quer esta militarização nas relações internacionais.

Silvia Cattori: Fez também pesquisas sobre os atentados de 11 de Setembro de 2001 e assinou um livro [13] em conjunto com outros intelectuais que se preocupam com as incoerências e as contradições na versão oficial dos eventos e nas conclusões da comissão de inquérito mandatada pelo senhor Bush. Não teme vir a ser acusado de "teoria da conspiração"?

Daniele Ganser: Os meus estudantes e outras pessoas têm-me perguntado se esta "guerra contra o terrorismo" está de facto relacionada com o petróleo e o gás e se os atentados de 11 de Setembro foram de facto manipulados, ou é uma coincidência que os muçulmanos de Ossama bin Laden tenham atacado exactamente na altura em que os países ocidentais começavam a perceber uma crise do petróleo? Comecei portanto a interessar-me pelo que se escreveu sobre o 11 de Setembro e a estudar também o relatório oficial apresentado em Junho de 2004. Quando se mergulha neste assunto, uma pessoa apercebe-se de imediato que há um grande debate planetário à volta do que realmente se passou em 11 de Setembro de 2001. A informação que se tem não é muito precisa. Uma pessoa começa-se logo por perguntar porque razão, num relatório de 600 páginas, nem sequer está mencionada a derrocada da terceira torre que ocorreu nesse mesmo dia. A comissão não se refere senão à derrocada das duas torres, as "Twin Towers". No entanto, há uma terceira torre de 170 metros de altura que se esbarrondou: a chamada WTC7. No caso dessa torre, fala-se dum pequeno incêndio. Falei com professores que conheciam bem a estrutura desses edifícios; os quais afirmam que um pequeno incêndio, em tal caso, não poderia nunca destruir uma estrutura daquelas dimensões. A história oficial sobre o 11 de Setembro e as conclusões da comissão não são credíveis. Tal ausência de clareza põe os investigadores numa situação muito difícil. Reina também a confusão sobre o que de facto se terá passado no Pentágono. Nas fotografias que se tem é muito difícil ver um avião e não se consegue perceber como é que um avião teria atingido o edifício.

Silvia Cattori: O Parlamento da Venezuela pediu aos Estados Unidos mais explicações sobre a origem dos atentados. Não deveria este ser um exemplo a seguir?

Daniele Ganser: Há muitas incertezas sobre o 11 de Setembro. Os parlamentares, os académicos, os cidadãos podem pedir contas sobre os que realmente se passou. Penso que é importante continuarmos a questionar-nos sobre o assunto. É um evento que ninguém consegue esquecer; cada um de nós lembra-se onde estava naquele momento preciso. É incrível que, cinco anos mais tarde, não se tenha ainda clarificado a questão.

Silvia Cattori: Dir-se-ia que tudo se passa como se as instituições não quisessem pôr em causa a versão oficial. Ter-se-iam deixado manipular pela desinformação organizada e pelos estrategas da tensão e pelas bandeiras-falsas?

Daniele Ganser: É-se manipulável quando se tem medo: medo de perder o seu trabalho, medo de perder o respeito das pessoas que se ama. Não se consegue sair desta espiral de violência e de terror se se deixar tomar pelo medo. É normal ter medo, mas é preciso falar abertamente desse medo e das manipulações que o geram. Ninguém poderá escapar às suas consequências. E isso é tão mais grave quanto os responsáveis políticos agem frequentemente sob o efeito do medo. É preciso encontrar força para dizer: "Sim, tenho medo de saber que estas mentiras causam sofrimento nas pessoas; sim, tenho medo de pensar que não há mais petróleo; sim, tenho medo de pensar que o terrorismo de que se fala é consequência de manipulações, mas não me vou deixar intimidar."

Silvia Cattori: Até que ponto países como a Suiça participam, neste momento, na estratégia da tensão?

Daniele Ganser: Penso que não haja estratégia da tensão na Suiça. Este país não sofre atentados terroristas. Mas, a verdade é que, na Suiça como em outras partes, os políticos que temem os Estados Unidos e a sua força têm tendência a dizer-se: são bons amigos, não temos interesse em batermo-nos contra eles.

Silvia Cattori: Essa maneira de pensar e de cobrir as mentiras que decorrem a estratégia da tensão não os torna um pouco cúmplices dos crimes de que ela é a responsável? A começar pelos jornalistas e pelos partidos políticos?

Daniele Ganser: Pessoalmente penso que toda a gente – jornalistas, académicos, políticos – devem de reflectir sobre as implicações da estratégia da tensão e das bandeiras-falsas. Estamos perante, é verdade, diante de fenómenos que escapam a qualquer compreensão. Por isso, de cada vez que há um atentado terrorista, é preciso questionarmo-nos e procurar descortinar o que ele esconde. E isso não será senão quando se admita oficialmente que as bandeiras-falsas são uma realidade, e que se possa fazer uma lista das bandeiras-falsas ao longo da história e pormo-nos de acordo sobre o que se deverá fazer.

A procura da paz é o tema que me interessa. É importante abrir o debate sobre a estratégia da tensão e tomar nota que se trata dum fenómeno bem real. Porque, enquanto se recusar a reconhecer a sua existência, não se poderá agir. Por isso é tão importante explicar o que significa realmente a estratégia da tensão. E, uma vez compreendido, não se deixar tomar pelo medo e pelo ódio contra um grupo. É preciso dizer que não é apenas um país que está implicado nisto; que são só os Estados Unidos, a Itália, Israel ou os iranianos, mas isto sucede em todo o lado, se bem que certos países participem mais intensamente que outros. O que é preciso é compreender, sem acusar tal ou tal país ou tal ou tal pessoa. O medo e o ódio não ajudam a avançar mas sim paralisam o debate. Vejo muitas acusações contra os Estados Unidos, contra Israel, contra a Grã-bretanha, ou alternativamente contra o Irão ou a Síria. A procura da paz ensina-nos que não nos devemos basear em acusações baseadas no nacionalismo, e que não é preciso nem ódio nem medo; que o mais importante é explicar. E essa compreensão será benéfica para todos nós.

Silvia Cattori: Porque é que o seu livro consagrado aos exércitos secretos da NATO, publicado em inglês, traduzido em italiano, em turco, em esloveno e, em breve, em grego, não foi publicado em francês?

Daniele Ganser: Ainda não encontrei editor em França. Se algum editor estiver interessado em publicar o meu livro, é com muito gosto que o verei traduzido em francês.

Silvia Cattori
Journaliste suisse

[1] Nato’s secret Armies : Terrorism in Western Europe por Daniele Ganser, prefácio de John Prados. Ed. Frank Cass, 2005. ISBN 07146850032005

[2] Foi depois do atentado na Piazza Fontana em Milão em 1969 que a expressão estratégia da tensão foi ouvida pela primeira vez.

[3] False flag operations (operações bandeira-falsa) é a expressão usada para designar as acções terroristas cometidas secretamente por governos ou organizações e de modo que pareça terem sido cometidas por outros.

[4] " Stay-behind : les réseaux d’ingérence américains " por Thierry Meyssan, Rede Voltaire, 20 de Agosto de 2001.

[5] Stay behind (o que significa : ficar atrás em caso de invasão soviética) é o nome dado às estruturas clandestinas treinadas para levaram a cabo um guerra de guerrilhas.

[6] Gladio designa o conjunto dos exércitos secretos europeus que estavam sob a direcção da CIA.

[7] Presidente do Conselho de Ministros, membro da democracia cristã.

[8] "Rapport Andreotti sur l’Opération Gladio" documento de 26 de Fevereiro de 1991, Biblioteca da Rede Voltaire.

[9] "1980 : carnage à Bologne, 85 morts" , Rede Voltaire, 12 de Março de 2004.

[10] "La France autorise l’action des services US sur son territoire" por Thierry Meyssan, Rede Voltaire, 8 de Março de 2004.

[11] Affaire Lavon, do nome do ministro da Defesa israelense que teve que se demitir quando a Mossad foi desmascarada como tendo tido parte nesses actos criminosos.

[12] Ver : "Odeurs de pétrole à la Maison-Blanche" , Rede Voltaire, 14 de Dezembro de 2001. "Les ombres du rapport Cheney" por Arthur Lepic, 30 de Março de 2004. "Le déplacement du pouvoir pétrolier" por Arthur Lepic, 10 de Maio de 2004. "Dick Cheney, le pic pétrolier et le compte à rebours final" por Kjell Aleklett, 9 de Março de 2005. "L’adaptation économique à la raréfaction du pétrole" por Thierry Meyssan, 9 de Junho de 2005.

[13] 9/11 American Empire: Intellectual speaks out, sob a direcção de David Ray Griffin, Olive Branch Press, 2006

http://www.voltairenet.org/article145221.htm

2007/03/22


2007/03/16





OPINIÃO Publicado 7 Março 2006
COMENTÁRIO
Breogan
As tecnologias do eng sanitário !

José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa, 1º ministro desta república, tem um bacharelato em Engenharia Civil pelo ISEC (Instituto Superior de Engenharia de Coimbra), informação que não é contestada. Porém, na sua biografia oficial é dito que Sócrates Pinto de Sousa é "Licenciado em Engenharia Civil". No perfil que foi publicado no Diário de Notícias, por Filipe Santos Costa, é dito que "... quando voltou à Covilhã, em 1981, Sócrates já tinha complementado o bacharelato com a licenciatura, em Lisboa". Mas a licenciatura que existia em Lisboa nessa altura (1979-81) era no Instituto Superior Técnico, onde Sócrates não consta como aluno. Por isso, em 1981 Sócrates não estaria licenciado por Lisboa. Onde foi que se licenciou? Teria sido no ISEL (Instituto Superior de Engenharia de Lisboa) do Instituto Politécnico de Lisboa? É que aí a Licenciatura Bi-Etápica em Engenharia Civil só começou em 1998/99... No ISEC onde fez o bacharelato? Mas a licenciatura bi-etápica em Engenharia Civil no ISEC também só começou em 1998/99. Também não frequentou a Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, nem o Instituto Superior Técnico, nem consta que tenha frequentado a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Portanto, não seria licenciado em 1981. Na Ordem dos Engenheiros também não está inscrito. O bacharelato em Engenharia Civil do ISEC tinha quatro anos (8 semestres) - só passou a três anos na reestruturação de 1988 (Decreto-Lei nº389/88, de 25 de Outubro) empreendida por Roberto Carneiro. Onde fez Sócrates a dezena e meia de cadeiras (veja-se o plano do 5.º ano da licenciatura no ISEL) que precisava com o bacharelato do ISEC para obter a licenciatura? Os Cursos de Estudos Superiores Especializados (4 semestres) só começaram no ISEC em 1991 e no ISEL em 1988 (Direcção, Gestão e Execução de Obras - 4 semestres) e 1990 (Transportes e Vias de Comunicação - 4 semestres). Além disso, um CESE não é uma licenciatura. Por isso, esta hipótese não parece plausível. Não é. Não consta que Sócrates tenha frequentado a licenciatura bi-etápica do ISEL ou do ISEC. Mas Sócrates afirma ainda que "concluíu depois uma pós-graduação em Engenharia Sanitária pela Escola Nacional de Saúde Pública" (ENSP). Todavia, o curso de Engenharia Sanitária é leccionado desde 1975 na Universidade Nova de Lisboa, pertencendo, desde a criação das faculdades da Nova, à sua Faculdade de Ciências e Tecnologia, primeiro sob a forma de curso de especialização e a partir de 1983 como mestrado. Exige a licenciatura como condição de admissão. Nunca pertenceu à Escola Nacional de Saúde Pública (que em Abril de 1994 foi integrada na Universidade Nova de Lisboa). Mas Sócrates não foi aluno desse curso de Engenharia Sanitária da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (que foi criado em 1975) - nem ele o diz, pois refere expressamente que a sua "pós-graduação" foi na ENSP. Então, que curso de Engenharia Sanitária fez? Chamar-se-ia mesmo "pós-graduação"? Ou seria um curso de curta duração na ENSP? E em que ano decorreu? Sócrates já seria licenciado quando frequentou essa "pós-graduação"? O que parece verdadeiro é que José Sócrates Pinto de Sousa terá obtido em 1996 uma licenciatura em Engenharia Civil pela Universidade Independente !!!!! Que equivalências lhe foram atribuídas e quantas cadeiras teve de frequentar e concluir ??? Se compararmos os planos dos dois cursos - o bacharelato do Politécnico de Coimbra e a licenciatura da Universidade Independente -, e as respectivas disciplinas, chegamos à conclusão de que um candidato com o bacharelato do ISEC precisa de fazer 10 cadeiras (existem algumas disciplinas do curso na Universidade Independente que não têm correspondência no curso de Coimbra) e mais uma de Projecto para se licenciar na Universidade Independente de Lisboa. Não deve ter sido fácil, tendo em conta que Sócrates teria concluído o bacharelato em 1979. A Licenciatura em Engenharia Civil na Universidade Independente foi criada pela Portaria n.º 496/95 de 24 de Maio de 1995, embora o diploma tenha, retroactivamente, autorizado o funcionamento do curso desde o ano lectivo de 1994/95. Ora, o primeiro governo de António Guterres (o 13.º Governo Constitucional) toma posse em 28 de Outubro de 1995 e José Sócrates é ministro adjunto do primeiro ministro. Nessa desgastante função, José Sócrates parece ter encontrado tempo e concentração, na mesma altura em que prepara e participa na campanha eleitoral durante o ano de 1995 e, já no Governo, adjuva o primeiro-ministro e coordena as secretarias de Estado da Comunicação Social, Desporto e Juventude, para, quinze anos depois do seu bacharelato, realizar as 11 cadeiras que, em princípio, teve de efectuar para obter o título de licenciado em Engenharia Civil em 1996. Deve ter sido muito difícil, um esforço quase sobre-humano. Não há motivo algum para que Sócrates tenha escondido do povo português a sua epopeia académica, a não ser por modéstia, o que, neste caso, não se justifica. É um motivo de grande orgulho próprio e um exemplo de sucesso para jovens e adultos. Enfim, não é de admirar a surpresa do engenheiro sanitário Pinto de Sousa perante a realidade técnica dos finlandeses.



O Genocídio dos funcionários públicos

Santana Castilho

Público 12-03-2007


O que o Governo acaba de propor para o funcionalismo público é a continuação de um genocídio em que os professores foram os primeiros imolados. Muitos dos que aplaudiram a cruzada, sendo funcionários públicos, perceberão, quando lhes tocarem à porta, que os dividendos do egoísmo são efémeros. O que se fez aos professores vai agora ser aplicado aos restantes funcionários públicos. Concluído este segundo assalto, o sector privado ficará à mercê da lógica dos patrões: se a precariedade já é máxima no público, por que havemos de manter o que sobra de estabilidade no privado? Pela mão de Sócrates, o Único, a esquerda moderna terá então feito, numa legislatura, mais do que a direita desejou, mas não fez, durante toda a Terceira República.



Os comportamentos mudam-se com incentivos, com formação, com comunicação organizacional, com chefias competentes, com gestão adequada. O grande problema dos serviços públicos não radica nos que obedecem. Está nos que mandam. Os que mandam querem convencer os indígenas de que a chave do sucesso é a avaliação do desempenho. Mas não sabem do que falam. O que produzem é tecnicamente grosseiro e com objectivos únicos: diminuir as remunerações, aumentar as horas de trabalho, despedir, vergar. Não será por aí que aumentarão a qualidade e a produtividade.

A avaliação do desempenho só serve se for um instrumento de gestão do desempenho. Os reformadores ignorantes confundem avaliação do desempenho com classificação do desempenho. Avaliar é comparar um percurso percorrido com um percurso planeado, para identificar obstáculos e formas de os superar. Supõe objectivos claramente definidos e estratégias adequadas. À boa gestão importa, sobretudo, o carácter formativo da avaliação: para identificar as dificuldades das pessoas e ajudá-las a superá-las, com formação e assistência; para apurar a ineficácia e a ineficiência dos processos e substituí-los por outros mais adequados. Um processo credível de avaliação tem uma lógica de 360 graus. Envolve todos. Não deixa de fora os chefes, obviamente.

Classificar é seriar. Tão-só! Tendo aplicações e importância, não põe conhecimento onde ele não existe. Pode haver avaliação sem classificação. Mas não se deve classificar sem se avaliar. A obsessão dos nossos reformadores reside na classificação. Construíram uma fantasia com a qual julgam chegar ao fim sem abordar o inicial e o intermédio. O que têm produzido são grelhas de classificação mal feitas, a aplicar por processos e critérios que a gestão moderna há muito abandonou. Isto não provocará mudança organizacional. Isto vai gerar, por parte dos funcionários visados, o que a literatura da especialidade denomina por retaliação organizacional. Ou seja, oposição dissimulada e desmotivação generalizada, a última coisa de que necessitamos para melhorar os serviços. Quando tal acontece, é evidente que a culpa não reside nos funcionários, mas nos chefes e nos processos e sistemas que impõem. Sobre o essencial para reformar a função pública, continuará a pairar o silêncio do Olimpo. Quanto a avaliação do desempenho, pura e simplesmente não existe. Apenas bolsa da pesporrência retórica e oca dos novos justiceiros.

O que se conhece da grelha proposta para classificar os professores que concorrerão ao topo da carreira é paradigma do que acabo de afirmar. Está lá tudo: o atropelo grosseiro à lei; a evidência de que legislam por impulso, sem coerência nem norte (começaram por achar que 120 pontos eram o mínimo e já baixaram para 95); o primado do administrativo sobre o pedagógico (menosprezo escandaloso da docência e do conhecimento, que chega ao ridículo de valorar ou não um doutoramento em função do dia em que foi feito). É a burocracia posta num altar, que nenhum Simplex disfarça.

2007/03/15

Encontro Nacional sobre Cultura
O PCP vai realizar um Encontro Nacional sobre a Vertente Cultural da Democracia, parte integrante do projecto de Democracia Avançada consagrada no nosso Programa.Este Encontro Nacional será antecedido por iniciativas descentralizadas que se constituem como espaços de aprofundamento dos temas em debate, nomeadamente do Projecto de Resolução Política do Encontro, e também como momentos que promovam o envolvimento do mais alargado conjunto de militantes possível e também a opinião de muitos independentes que connosco trabalham e lutam nos vários campos da vida cultural. O Encontro terá lugar a 26 de Maio, no Anfiteatro da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa.
Anteprojecto de Resolução Política do Encontro Nacional do PCP sobre CulturaComissão Nacional do PCP para a Área da Cultura
A vertente cultural da democraciaEmancipação, Transformação, Liberdade

2007/03/14



LEI DE SALAZAR

2007/03/13

CORTE ORÇAMENTAL

2007/03/11

Prefácio às Obras Escolhidas de Álvaro Cunhal
Integrado nas comemorações do 86º aniversário do PCP, é hoje lançado o I volume das Obras Escolhidas de Álvaro Cunhal. Odiario.info publica o prefácio, da autoria de Francisco Melo, dessa importante iniciativa das Edições Avante.
Francisco Melo* - 06.03.07
«Nada nos impede portanto de começar a nossa crítica pela crítica da política, pela tomada de partido na política, portanto, pelas lutas reais, e de nos identificarmos com elas. Nós não enfrentamos então o mundo, de modo doutrinário, com um princípio novo: está aqui a verdade, ajoelhai-vos! Nós desenvolvemos para o mundo, a partir dos princípios do mundo, novos princípios.»
(K. Marx, Carta a A. Ruge, Setembro de 1843 In Marx- Engels Gesamtausgabe (MEGA2) vol III/I, p. 56
A obra teórica e política de Álvaro Cunhal imprimiu de tal modo a sua marca no percurso de luta do PCP ao serviço dos trabalhadores, do povo e do país durante sete dezenas de anos que lhe conferiu a matriz da sua identidade própria e do seu projecto revolucionário. Estes, ao terem mostrado ser capazes de resistir e afirmar-se contra ventos e marés adversos da história, constituíram-se em património inalienável do Partido a que Álvaro Cunhal dedicou a sua penetrante inteligência, a riqueza da sua multifacetada personalidade e a sua inexcedível capacidade de trabalho. Esse património, ao perviver e frutificar no quadro duma globalização capitalista rapace e terrorista, substancia uma responsabilidade iniludível do PCP, na medida em que dá um alcance internacional, não obstante as suas originalidades e particularidades, à sua experiência histórica de transformação revolucionária da sociedade, Preservar esse património, desenvolvendo-o e enriquecendo-o, é a melhor prova do nosso reconhecimento, da nossa fidelidade à mensagem mais profunda de Álvaro Cunhal: sermos capazes de, teórica e praticamente, enfrentarmos e superarmos os tremendos desafios que hoje se nos colocam. Intervindo, tal como ontem, tal como amanhã, na dialéctica objectiva da história.
O estudo da obra de Álvaro Cunhal é uma das principais vertentes estruturantes da formação política e ideológica dos militantes comunistas, nomeadamente daqueles que, por todo o país, dia a dia vão alargando as fileiras do PCP. Ele permite-lhes, por um lado, adquirir espessura histórica consolidadora de opções recentes, fruto de experiências de vida diferenciadas — o que só pode ser enriquecedor —, mas que podem ser ocasionais, circunstanciais, e portanto efémeras; por outro lado, dá fundamento consciente, racional, a imprescindíveis convicções, ao mesmo tempo que recusa seguidismos acríticos, sempre redutores e isolacionistas.
Porém, a leitura e o estudo da obra de Álvaro Cunhal não são apenas importantes para os militantes comunistas. São também indispensáveis para todos quantos queiram conhecer com verdade o que foi o fascismo, o que foi a resistência ao fascismo, o que foi a história do nosso país sob o regime fascista e o que foi o processo libertador do 25 de Abril e as suas realizações, quais foram as formas de que se revestiu a contra-revolução capitalista que tem conduzido o nosso país à ruína, à miséria dos trabalhadores e do povo, à perda da nossa soberania e independência nacionais. E que lamentavelmente prossegue.
Conhecer a obra de Álvaro Cunhal é fundamental ainda para todos quantos queiram estar na vida e agir de uma forma esclarecida, consciente e, digamos também, digna, pois ela é um exemplo e uma lição de dignidade humana.
O que se segue não pretende ser mais do que um breve roteiro da selecção de textos de Álvaro Cunhal reunidos neste I tomo das suas Obras Escolhidas e uma explicitação dos critérios nela utilizados.
Constituem o presente tomo textos escritos entre 1935 e 1947, à excepção de dois como a seu tempo referiremos. Quando escreveu na imprensa legal os dois primeiros artigos que abrem este tomo, Álvaro Cunhal acabara de fazer 21 anos, mas neles se evidencia já uma assimilação do marxismo com reflexão própria, que irá desenvolvendo com a experiência e o estudo, e que será uma das características fundamentais que fará dele o maior pensador político do século XX em Portugal.
As cartas para a Internacional Comunista da Juventude (ICJ) que a seguir se publicam revelam, por outro lado, o dirigente político juvenil, então empenhado na transformação da Federação das Juventudes Comunistas numa organização de massas, liberta de sectarismos, de acordo com as orientações do VI Congresso da ICJ no qual participara. Tal objectivo só virá a encontrar expressão plena mais de uma década depois com a criação do MUD Juvenil, num caminho longo e difícil de que nos dão conta entre outros os seus informes ao III e IV Congressos do PCP.
Homem de cultura integral, Álvaro Cunhal plasmará os seus conhecimentos e o seu empenhamento político nas suas intervenções críticas — num contexto de uma ditadura fascista no plano interno e de um ascenso impetuoso do fascismo e do nazismo no plano internacional — em domínios como as artes plásticas e a literatura, como o patenteiam as cartas a Abel Salazar e os artigos publicados na Seara Nova (em que polemiza com o «umbiguismo» de José Régio). É também naquele contexto e naquele tempo que mergulham as suas raízes as reflexões de cunho ético, humanista e sociológico sobre os intelectuais e a responsabilidade histórica individual, sobre a situação das crianças e jovens, sobre a sexualidade e o amor, expressas nos artigos publicados em O Diabo e Sol Nascente.
O desencadear da Segunda Guerra Mundial levará Álvaro Cunhal, ainda em artigos publicados em O Diabo, a uma contundente crítica da demagogia e hipocrisia na justificação da guerra por parte dos seus protagonistas iniciais (Alemanha, França e Inglaterra) e a uma acesa polémica com Câmara Reys, director da Seara Nova, com cujos responsáveis cortara relações por estarem «a reproduzir e a valorizar as interpretações fascistas dos actuais acontecimentos mundiais» nas páginas da revista.
O ensaio O Aborto. Causas e soluções é o seu último escrito antes de passar à clandestinidade incluído neste tomo. Com base numa concepção materialista da história, Álvaro Cunhal analisa as teorias sobre a população, a natalidade e o aborto como reflexos de diferentes etapas do capitalismo, passando depois para a consideração das causas económicas, sociais e morais do aborto, mostrando a «catástrofe» que o aborto clandestino representa e o carácter prejudicial, degradante e inútil da legislação repressiva nesta matéria. De passagem evidencia as vantagens alcançadas com a legalização do aborto na URSS. Finalmente, com base em dados estatísticos, mostra o «flagelo» do aborto clandestino em Portugal, defendendo a sua legalização, enquanto subsistirem as causas que a ele conduzem, dado os benefícios que ela traz.
A participação de Álvaro Cunhal na reorganização empreendida em 1940-1941 vai fazê-lo emergir como dirigente político-partidário destacado, aplicando o marxismo-leninismo de forma concreta na análise do fascismo em Portugal, integrado na conjuntura internacional da Segunda Guerra Mundial. Os seus informes ao III Congresso, realizado em finais de 1943 (incluídos neste tomo), traduzem bem a experiência adquirida com a reorganização do Partido e com a luta de massas (em que se destacam as greves de Outubro-Novembro de 1942 e mais ainda as de Julho-Agosto de 1943 em que o Partido se assumiu como a vanguarda da classe operária), assim como com os esforços para unir todas as forças progressistas e patrióticas do país numa luta contra a política de traição nacional do fascismo.
Concepções fundamentais são elaboradas ou desenvolvidamente reafirmadas:
— não pertencendo a grande maioria da classe operária em Portugal a organizações políticas e não tendo as outras organizações políticas operárias além do Partido expressão no nosso país, a frente única da classe operária teria de revestir uma forma diferenciada da de outros países, só podendo ser alcançada na luta diária pelos seus interesses imediatos;
— dada a necessidade de os comunistas estarem onde estão as massas uma outra se impunha: a da penetração e do trabalho nos Sindicatos Nacionais em vez da criação de sindicatos ilegais desligados das vastas massas operárias;
— o movimento de Unidade Nacional Antifascista, no qual tinham lugar todas as forças e personalidades antifascistas sem «separações fundadas em divergências políticas ou religiosas», apenas na base de amplas lutas de massas se podia desenvolver;
— a conjugação da luta de massas com um amplo movimento democrático unitário tinha como correlato necessário o repúdio de concepções putschistas (mas com a ressalva de que a dar-se uma «revolução de palácio» os comunistas deveriam «tomar um papel activo a fim de lhe imprimir um conteúdo mais democrático e progressivo»);
— se o fascismo tinha que ser derrubado e só o podia ser pela força das armas, contudo a via para esse derrube não era a da conspiração militar, mas a da insurreição popular, a qual requeria a criação de uma situação objectiva de crise revolucionária.
E assim, reflectindo e simultaneamente modelando o Partido pela intervenção prática e teórica, Álvaro Cunhal assume-se como a sua expressão cada vez mais plena e carismática. Com o III Congresso, o partido da classe operária e dos trabalhadores portugueses, o partido conglomerador de todos os antifascistas, o partido da luta pela liberdade, pela democracia e pela independência dos povos, começa a forjar um património político que perdurará para o futuro.
A crítica, já iniciada no III Congresso, a «alguns graves erros cometidos quando da reorganização de 1940-41» é fortemente complementada por um documento inédito não datado sobre o folheto de 1941 O Menino da Mata e o seu Cão Piloto (Frente à provocação), documento que aqui se inclui pela identidade da sua temática.
Seguem-se dois conjuntos de cartas: um para o Conselho Nacional de Unidade Antifascista (CNUAF), cuja criação é divulgada em Janeiro de 1944, e outro para a Organização Comunista Prisional do Tarrafal (OCPT).
O primeiro revela-nos a intervenção constante e directa de Álvaro Cunhal na organização, funcionamento e orientação do CNUAF ao longo de um ano e meio. São traços distintivos dessa intervenção, entre outros:
— a necessidade de estruturação do movimento de Unidade Antifascista à escala nacional;
— a concepção deste como um amplo movimento unitário virado para o trabalho de massas e agindo articuladamente com a luta das classes trabalhadoras para a «criação da situação insurreccional, no decurso da qual o fascismoseria derrubado pela força»
— a instauração na sequência desse derrube assim conseguido de um «Governo Nacional Democrático»;
— a defesa da independência organizativa, ideológica e de acção do Partido enquanto participante num movimento de unidade com organização própria;
— a luta intransigente contra concepções putschistas, atentistas e oportunistas, sempre renascentes nas forças democráticas não comunistas (e também no próprio Partido);
— a crítica dos «grandes planos governativos para depois» em detrimento da luta desde já para obter o apoio do povo, das massas, das forças armadas, como condição do triunfo da revolução nacional democrática, coveira do fascismo salazarista;
— a elaboração de um Programa de Emergência do Governo Provisório, cujas medidas fossem «ao encontro dos interesses e aspirações imediatas de largas camadas da população portuguesa», incluindo «a libertação de Portugal da influência e dos manejos económicos, políticos e de espionagem da Alemanha hitleriana» e «a colaboração com as Nações Unidas», paralelamente à destruição do Estado fascista e até à instauração de uma nova ordem constitucional por uma Assembleia Constituinte livremente eleita.
O segundo conjunto de cartas da autoria de Álvaro Cunhal e escritas ao longo de 1944 (à excepção da enviada em Junho de 1943 para José de Sousa como última tentativa de permanência deste nas fileiras do Partido), de recente divulgação (Dossier Tarrafal, Edições «Avante!», Lisboa, 2006) e uma delas inédita, evidencia a importância com que eram encaradas as relações com a OCPT, de que faziam parte destacados quadros do Partido. Nelas é dada uma informação pormenorizada dos progressos organizativos do Partido, do trabalho de direcção, dos problemas de quadros e de fundos, das tiragens da imprensa partidária, dos ataques da repressão, da mobilização de massas e da organização e condução de greves (particularmente as de 8 e 9 de Maio de 1944), da formação e estruturação do CNUAF e das dificuldades da sua actividade, da orientação da acção do Partido no seu seio, etc.
O ano de 1945 ficou marcado no plano sindical pelo facto de, pela primeira vez desde a dissolução dos sindicatos livres em 1933-1934, seguindo a orientação do Partido, os trabalhadores terem acorrido em massa às eleições para os Sindicatos Nacionais logrando alcançar a eleição de direcções de homens honrados em dezenas de sindicatos. Em «Experiências fundamentais das eleições sindicais de 1945» Álvaro Cunhal, assinalando esse facto, analisa também as deficiências verificadas com vista à sua correcção em futuras eleições.
Da participação de Álvaro Cunhal no IV Congresso, realizado em 1946, dão-nos conta os dois informes que apresentou: O Caminho para o Derrubamento do Fascismo e Organização. Publicamos também neste I tomo o extenso Prefácio que escreveu para a reedição do primeiro em 1997 por permitir uma compreensão plena dos seus informes e da importância histórica do IV Congresso, no qual encontraram uma definição paradigmática, permitindo projectá-las para a actualidade, características identitárias do PCP e do seu projecto político de transformação revolucionária da sociedade.
Quando da realização do Congresso, o fascismo fora derrotado na guerra, mas assistia-se, por parte dos países capitalistas, ao desencadeamento de uma nova ofensiva anticomunista que se traduzia em Portugal no apoio à ditadura salazarista ao serviço dos monopolistas e latifundiários («camarilha de exploradores sem pátria»), agravando a dependência económica do país. Ao analisar essa situação, o informe político de Álvaro Cunhal veio pôr claramente a nu a ligação indissolúvel no nosso país entre a luta pela liberdade e a democracia e a defesa da independência nacional. É uma tese que conserva plena validade nos nossos dias.
Ao acentuar que «Salazar e a sua camarilha pela força e só pela força se têm mantido no poder» e que portanto «para os derrubar será preciso o emprego da força» — entendendo-se por tal um «levantamento nacional», uma «insurreição nacional contra o fascismo» —, Álvaro Cunhal rejeitava veementemente as concepções que entendiam por emprego da força um golpe militar putschista ou uma «revolução de palácio», desligados das lutas de massas. Ao mesmo tempo desmistificava a passividade, o «atentismo», dos que, no movimento democrático, esperavam de acções exteriores por parte das democracias burguesas o «milagre» da queda da ditadura fascista. E não poupava também as propostas dos que, no próprio Partido, apontavam como sendo objectivo deste «a desagregação do fascismo» de que resultaria uma «queda pacífica de Salazar». Era a «política de transição», alvo de uma intensa crítica de Álvaro Cunhal como concepção direitista, de abdicação da revolução e de destruição do Partido como organização política autónoma e de classe, como vanguarda revolucionária da classe operária e de todos os trabalhadores. As medidas que os seus defensores propunham — entre outras a diluição do Partido no movimento da Oposição democrática e a retirada do Avante! da foice e do martelo e da palavra de ordem «Proletários de todos os países, uni-vos!» — falam por si. A crítica do oportunismo feita no IV Congresso mantém plena actualidade, pois ele espreita sempre em cada curva da história como a experiência tem demonstrado. Os informes de Álvaro Cunhal mostraram a importância das organizações unitárias quando estreitamente ligadas às massas e actuando como organizadoras e impulsionadoras da acção das próprias massas. No caso da luta sindical, tal orientação permitiu significativos progressos na concretização da linha definida no III Congresso de «converter os Sindicatos Nacionais, de organismos defensores dos interesses do patronato, em organismos defensores dos interesses da classe operária» e apontar a perspectiva da «criação dum movimento sindical unificado à escala nacional». Foi a arrancada histórica para a ulterior formação de um movimento sindical nacional de classe, de massas, independente, democrático e unitário, que continua a resistir e a lutar em defesa dos interesses dos trabalhadores e do país. Os textos de Álvaro Cunhal mostram-nos como, além da justeza da linha política, o reforço das organizações de base e da ligação destas à Direcção central e às massas tiveram — e a experiência mostra-nos que continuam a ter — um papel fundamental no desenvolvimento da luta da classe operária, das massas populares e da unidade democrática, no alcançar de êxitos na acção política e no aumento da influência do Partido. De grande significado e importância se revestiu a definição do «centralismo democrático» de acordo com a experiência histórica do Partido. Como Álvaro Cunhal acentua no Prefácio, aos «quatro elementos» clássicos são acrescentados «o direito dos militantes do Partido discutirem democraticamente toda a orientação»; a crítica e autocrítica são consideradas «uma base fundamental de trabalho»; é estabelecida a obrigatoriedade da «prestação de contas» e de «formas democráticas de trabalho sempre que não colidam com o trabalho conspirativo»; a «disciplina de ferro» é associada aos direitos democráticos dos militantes; e é conferido o valor de princípio à «ligação às massas sem partido». O Partido surgia assim como «Partido leninista definido com a experiência própria», tal como hoje continua a suceder, em que a direcção colectiva e o trabalho colectivo se tornaram traços distintivos e determinantes do estilo de trabalho do Partido e que encontrariam a sua plena expressão enquanto integrantes do conceito de «colectivo partidário». No informe sobre Organização, Álvaro Cunhal lembra que qualquer militante «pode e deve, por via da organização, participar na elaboração da linha política e táctica do Partido», que «dentro do Partido são admitidas divergências de opinião», sendo estas «mesmo vantajosas para o Partido, quando se manifestam dentro das normas orgânicas do Partido». Mas exclui-se evidentemente, «na defesa da unidade do Partido», a existência de «todos e quaisquer grupos, formados dentro do Partido, à base de "linhas políticas próprias", ou "plataformas políticas", ou concepções próprias de trabalho, de todos e quaisquer grupos formados dentro do Partido à volta deste ou daquele camarada."» A história comprovou a justeza destas orientações. Passado um ano, Álvaro Cunhal vai apresentar ao Comité Central um extenso informe intitulado Unidade, Garantia da Vitória no qual submete a pormenorizado exame a ofensiva imperialista anglo-norte-americana, apoiada pelo Vaticano, e a política de alinhamento de Salazar com ela para se manter no poder. A política económica do salazarismo é em seguida analisada, concluindo-se que ela condenou o país ao atraso e que, «protegendo os lucros fabulosos, entregando a agricultura, os transportes, os abastecimentos, aos monopólios corporativos, intensificando a exploração das classes trabalhadoras, espoliando o pequeno produtor, reduziu a produção, deu campo livre à alta dos preços e ao mercado negro.» Por outro lado, em vez da «aplicação dos proventos do Estado em obras reprodutivas, o salazarismo absorveu-os na constituição de um gigantesco aparelho repressivo, na propaganda, nas conspiratas com a reacção internacional, na burocracia, na corrupção que invade os organismos do Estado». Acresce que também «as reservas monetárias, em vez de aplicadas no apetrechamento técnico da nossa agricultura, indústria, transportes» foram aplicadas na importação de «géneros de primeira necessidade, concorrendo com a produção nacional». E, conclui Álvaro Cunhal, com a continuação dessa política, «a economia nacional tem diante de si perspectivas de uma grave crise e duma intervenção cada vez maior do capital estrangeiro, reduzindo a uma imagem literária a independência portuguesa». Álvaro Cunhal revela depois os objectivos de uma propalada «Reforma Agrária» que não visava mais que «responder ao descontentamento das centenas de milhar de camponeses assalariados», «criar uma nova classe camponesa reaccionária» para servir de «tampão entre os grandes agrários e a massa assalariada», fazer face aos «clamores que condenem o salazarismo de responsável da incultura e do atraso da agricultura nacional». Por tudo isso, «a nação está contra Salazar». E porque o está, ele «não concede liberdades nem convoca eleições livres» ao mesmo tempo que «procura atrair os elementos mais vacilantes» do campo democrático e «mostrar que os comunistas são o único obstáculo à concessão das liberdades e à intervenção dos outros democratas na vida política» com o objectivo de «quebrar a unidade democrática» e de criar uma «oposição inofensiva». Não sem «alguns sucessos», o que revela a existência de perigos para a unidade. Um exemplo entre outros apresentados por Álvaro Cunhal: «Em algumas reuniões realizadas por democratas de outros agrupamentos políticos, foi defendida a necessidade de romper com os comunistas, pois estes estavam sendo o obstáculo à conquista das liberdades em Portugal. Foi ainda defendida a necessidade de não apoiarem o MUNAF e o MUD e agirem de forma "independente"». Salazar prepara nova manobra pseudodemocrática com vista às próximas eleições, adverte Álvaro Cunhal. Daí a necessidade de uma «luta aberta» contra os derrotistas, divisionistas e liquidacionistas, como os que acham «que o MUNAF não corresponde já às condições existentes» ou que dizem que «deixou simplesmente de existir»; como os que pretendem «que o MUD deve meter-se na concha» e se opõem «à criação de Comissões do MUD, particularmente de trabalhadores, e a qualquer actuação de massas». A última parte do informe é dedicado ao Partido. Três aspectos fundamentais são considerados: «o seu fortalecimento ideológico», «a sua consolidação orgânica e «o desenvolvimento dos quadros».Abordaremos apenas o primeiro aspecto. Álvaro Cunhal procede a uma explanação sobre «a autêntica revisão do marxismo» empreendida por Browder, secretário-geral do Partido Comunista dos Estados Unidos, e sobre os prejuízos que trouxe ao movimento comunista em vários países, para chegar à análise crítica de «tendências paralelas» ou de opiniões baseadas nas de Browder no nosso Partido e à conclusão da necessidade «duma extrema vigilância política e da fidelidade aos princípios do marxismo-leninismo». De seguida é retomada e desenvolvida a crítica à «política de transição» feita no IV Congresso, procurando-se agora pôr «verdadeiramente a nu a raiz oportunista dessas concepções», a sua filiação numa «análise não-marxista da situação», de modo a impedir que elas renasçam. É com considerações sobre o marxismo-leninismo que Álvaro Cunhal encerra este ponto, acentuando que ele «é uma ciência ligada à vida e às condições de lugar e de tempo, uma ciência que se enriquece com novas experiências e novos conhecimentos», não nos dando por isso «receitas para cada situação difícil». É por isso imprescindível que o «estudo dos teóricos do marxismo seja acompanhado pelo estudo da realidade portuguesa» e «com a preocupação constante da tarefa que os comunistas portugueses têm diante de si». Transcrevem-se a seguir no presente tomo dois textos de Álvaro Cunhal, publicados primeiro anonimamente em O Militante (Setembro e Outubro), sobre as greves de Abril de 1947 dos operários das construções e reparações navais. No primeiro, em que se debruça sobre os problemas de orientação, começa por salientar «a vitória que constituiu, para os operários de Lisboa e para o PCP, a greve de Abril», passando em seguida a fazer uma apreciação crítica das orientações do Partido face ao evoluir da greve para extrair os seguintes ensinamentos: necessidade de «fortalecer a ligação do Partido com as massas» para que as organizações conheçam «em cada momento, as verdadeiras aspirações e as verdadeiras disposições das massas»; necessidade de o Partido nunca ir «nem demasiado atrás nem demasiado à frente das massas», de modo a não perder o contacto com elas, «imprescindível para uma correcta orientação»; finalmente, necessidade de as palavras de ordem corresponderem «às condições objectivas e de organização existentes». No segundo, dedicado às questões de organização, Álvaro Cunhal mostra como «a condução dum movimento de massas exige a existência de organismos capazes de acompanhar a situação e dirigir as massas em todas as fases do movimento». Assim, se as Comissões de Unidade de empresa e a Comissão Geral corresponderam à necessidade do movimento «enquanto a luta se desenrolou no terreno legal», os Comités de Greve criados na base daquelas, não distintos delas e funcionando de modo idêntico, não foram capazes de «assegurar a direcção diária da greve, sobretudo a partir do momento em que o fascismo encerrou fábricas, prendeu operários, espancou manifestantes e fez cair sobre as massas uma violenta repressão». Nas «Notas à margem do trabalho de Vilar: o Latifúndio e a Reforma Agrária» é a questão agrária em Portugal que adquire um lugar de destaque. Álvaro Cunhal considera o trabalho de Fogaça (Vilar) de grande importância e de leitura obrigatória para «os camaradas responsáveis do Alentejo, Ribatejo e Trás-os-Montes», lamentando, por razões da sua actividade política, não poder então desenvolver a análise que dele faz. Contudo, dispondo de um conhecimento teórico e metodológico muito mais sólido das questões agrárias, Álvaro Cunhal, além de críticas factuais, resume logo de início a principal deficiência do estudo de Fogaça: «A tese apresentada sobre o latifúndio (seus malefícios e necessidade duma reforma agrária) é justa, mas o trabalho encerra-se demasiado dentro dessa tese, sem aflorar sequer outros problemas cuja compreensão é indispensável para a consideração do problema do latifúndio. Assim, por exemplo, não é dada uma ideia clara da diferença entre latifúndio e grande exploração capitalista, não se apresenta o papel do latifúndio no desenvolvimento do capitalismo, nada se diz dos progressos do capitalismo na agricultura portuguesa». «E de tudo isto resulta que não são expostas ideias claras e justas sobre a grande e a pequena exploração agrícola», que Álvaro Cunhal considera «um problema fundamental» quando se trata da reforma agrária. Além dos textos referidos, representativos das diferentes fases e diversas facetas da produção teórico-política de Álvaro Cunhal, todos assinados com o seu nome ou com diferentes pseudónimos seus, incluem-se no presente tomo outros não assinados por si ou mesmo subscritos por organismos dirigentes do Partido, mas que sabemos por testemunhos escritos inquestionáveis serem de sua autoria. Publicamo-los para dar a verdadeira dimensão da produção teórica de Álvaro Cunhal e do seu papel sem paralelo na vida e na história do PCP. Ao inseri-los como Anexos apenas pretendemos assinalar a referida diferença formal. Figuram nos Anexos os seguintes textos: O Partido Comunista ante Algumas Tendências Prejudiciais dentro do Movimento de Unidade Democrática (Dezembro de 1946), A Célula de Empresa (2.ª edição, 1947) e O Partido Comunista, os Católicos e a Igreja (1947). A atribuição da autoria destes textos a Álvaro Cunhal consta de um documento intitulado «Algumas notas sobre a actividade revolucionária do nosso camarada Álvaro Cunhal» (Novembro de 1952), assinado por Alberto (José Gregório) e escrito «para a mobilização da classe operária e das restantes camadas laboriosas para a luta em torno da libertação do nosso camarada Álvaro Cunhal». Também na «Biografia do Camarada Álvaro Cunhal», do Secretariado do Comité Central do Partido Comunista Português («Edições Avante!», 1954), se mencionam como de sua autoria os dois últimos* Uma breve referência a cada um deles. No primeiro, são retomadas, à luz de casos recentes, as críticas a tendências oportunistas no Movimento de Unidade Democrática (MUD) feitas no IV Congresso e noutros documentos. A «velha e prejudicial tendência» para esperar a «queda automática» do fascismo manifesta-se, como refere Álvaro Cunhal, na «elaboração de grandes planos para depois» com a consequente distracção das «atenções dos problemas presentes, criando ilusões de que o fascismo cairá sem ser por nossa acção e levantando elementos de divergências e desentendimentos». É o caso de uma «proposta do Dr. Ferreira de Macedo», em que também se repete o erro «de considerar um movimento de Unidade de várias correntes políticas como se fosse um partido político ou substituindo-se aos partidos políticos» e «se comecem a elaborar programas governamentais» próprios. É o caso da «proposta da secção de conferências da Comissão dos Escritores, Jornalistas e Artistas Democráticos» visando a elaboração, por «técnicos» remunerados, de «soluções para os problemas nacionais, independentemente das opiniões dos partidos e outras forças antifascistas». É o caso da proposta da «Comissão Distrital do Porto para a realização de um Congresso do MUD», o qual «em vez de traçar perante a nação o caminho a percorrer para o derrubamento do fascismo, em vez de definir as formas de actuação prática, faria um apelo aos altos comandos fascistas para darem um golpe de Estado, convocarem "eleições livres" e "manterem a ordem"». É o caso da proposta da «Comissão Central aprovada por aclamação» na reunião na Voz do Operário em 30 de Novembro de 1946, na qual é reclamada a «liberdade de organização e actuação de partidos políticos» e não «dos partidos políticos» revelando que «há muitos democratas que hoje evocam o apoio do Partido Comunista e das classes trabalhadoras, mas que aceitariam de bom grado uma legalidade "para todos menos os comunistas"». Na referida proposta é reclamada também uma «nova lei eleitoral», mas que omite a exigência do «sufrágio universal», mostrando assim «a existência no seu seio de tendências antidemocráticas» que divorciavam o MUD das classes trabalhadoras e evidenciavam o receio do povo e das massas. Surgidas na sequência da reorganização de 1940-1941, as células de empresa viriam a ocupar um lugar central na organização e actividade do Partido. A Célula de Empresa foi publicada pela primeira vez em 1943, mas de acordo com o critério que adoptámos de publicar a versão mais elaborada, mais recente, desde que essa versão tenha sido redigida pelo autor originário, é a edição «revista e aumentada» de 1947 que incluímos no presente tomo (as edições posteriores contêm alterações, cortes e acrescentos que não foram feitos por Álvaro Cunhal). Enquanto síntese da experiência de organização e de luta do Partido, A Célula de Empresa tornar-se-ia uma obra emblemática na história do Partido. Álvaro Cunhal começa por abordar a célula de empresa na decorrência da concepção leninista do Partido e da natureza de classe deste: Partido da classe operária é nos locais de trabalho («nas fábricas, nas oficinas, nas empresas, nos armazéns, nas estações de caminhos-de-ferro, nas companhias de transportes, etc.») que se situa a sua organização básica — a célula de empresa. Passa em seguida a uma análise pormenorizada, feita de forma pedagógica, da estruturação da célula de empresa e do seu funcionamento interno (nomeadamente a maneira como se devem processar as reuniões); da sua ligação com as lutas reivindicativas (que lhe compete «impulsionar e dirigir» com base no estudo das «condições de trabalho dentro da empresa», das «aspirações mais imediatas dos trabalhadores» e da sua «disposição para a luta»); da sua ligação com a luta sindical (estudando formas de actuação junto dos sindicatos para que estes apoiem as reivindicações dos trabalhadores, coordenando a sua actividade com a das células de outras empresas para a elaboração de listas de unidade para concorrer às eleições sindicais, formando comissões sindicais para acompanhar a vida dos sindicatos e interessar os trabalhadores na actividade sindical); da sua ligação com o Movimento de Unidade Democrática (criando Comissões do MUD dentro das empresas que conduzam «regularmente uma actividade de organização e agitação do MUD» e «lutas políticas parciais»), etc. A concluir, Álvaro Cunhal detém-se na questão do recrutamento (a célula «deve levar a cabo uma sistemática actividade de captação de novos operários»), nos cuidados a observar na admissão de novos militantes e na defesa face à repressão observando as regras conspirativas. Em síntese: à célula de empresa cabe «orientar, comandar as batalhas que os trabalhadores da empresa travam contra os patrões, contra as formas de exploração e dominação do capitalismo, contra a miséria e o terror do salazarismo». Nos informes de Álvaro Cunhal aos III e IV Congressos, a relação do Partido com os católicos, o apoio da Igreja ao fascismo de Salazar e a participação do Vaticano na cruzada anticomunista a nível mundial tiveram lugar de destaque. Em O Partido Comunista, os Católicos e a Igreja essa problemática é desenvolvida de forma sistematizada. Álvaro Cunhal começa por lembrar que o «Partido Comunista, ainda que tendo como base teórica o materialismo dialéctico, entende que as convicções religiosas, por si só, não são susceptíveis de afastar os homens na realização de um programa social e político e que, desta forma, comunistas e católicos podem e devem unir-se em defesa dos seu anseios comuns, em defesa dos interesses e aspirações dos deserdados e ofendidos, do povo e do país». Qual a resposta que os católicos têm dado a esta posição do Partido? «Aqui há que distinguir», diz Álvaro Cunhal, entre, por um lado, «os trabalhadores católicos, assim como muitos católicos progressistas, particularmente jovens» que «têm compreendido a necessidade desta união e têm engrossado a frente da luta pelo pão, pela liberdade, pelo progresso e pela independência»; e, por outro, a Igreja Católica que «pela boca dos seus mais autorizados representantes» tem intervindo activamente «ao lado da ditadura fascista contra as aspirações democráticas do povo português». É esta intervenção da Igreja Católica que passa então a historiar, com abundância de exemplos tirados das declarações do seu mais alto representante, o Cardeal Cerejeira, e das palavras da imprensa regional católica, nos últimos anos. E alerta: este caminho «por que enveredou a Igreja não é o que mais convém ao povo português, não se harmoniza com os seus interesses e a independência do país e não é também o que mais convém aos católicos e à própria Igreja». Afirmando em seguida que o «apoio que a Igreja dá a Salazar deriva também de instruções vindas de Roma», Álvaro Cunhal cita vários exemplos dessas instruções, integradas na política externa do Vaticano que mostra caracterizar-se «pela pregação e preparação activa da cruzada anti-soviética, pela luta contra todas as realizações democráticas, pela defesa do fascismo sobrevivente e preparação da sua revanche». Depois de pôr a descoberto a hipocrisia e a falsidade das proclamações da política social da Igreja, dirige-se aos católicos: «Se temos aspirações comuns, devemos agir em comum para a sua realização.» E termina, voltando-se para o futuro: «O nosso desejo é que, na obra de reconstrução democrática de Portugal, não haja convicções religiosas nem ideias filosóficas que afastem os homens e prejudiquem o seu esforço conjugado para assegurar ao nosso Povo e à nossa Pátria dias melhores e mais livres.» E chegamos assim ao fim da apresentação sintética do conteúdo deste I tomo das Obras Escolhidas de Álvaro Cunhal, no qual reunimos os textos mais representativos das diversas facetas da sua produção teórica. Resta-nos esclarecer que, não sendo nosso objectivo fazer uma edição crítica, procurámos oferecer aos leitores uma edição que: a) fosse rigorosa quanto à fixação dos textos; b) fornecesse dados informativos em notas de pé de página e, sobretudo, em notas finais que, embora sem carácter sistemático, informassem acerca da proveniência dos textos, facultassem dados de carácter histórico necessários à inteligibilidade dos mesmos, esclarecessem referências bibliográficas fundamentais e estabelecessem uma intertextualidade em relação a temas recorrentemente tratados pelo autor (predominantemente no âmbito deste I tomo, mas com referências ocasionais a textos posteriores). Cabe aos leitores julgar se os nossos propósitos foram alcançados.(*) Se Fores Preso, Camarada (1947) é um texto igualmente atribuído a Álvaro Cunhal nos dois documentos e como tal o publicaremos no II tomo das Obras Escolhidas, de acordo com o critério que adoptámos de publicar a versão mais recente de uma obra desde que feita pelo seu autor originário. *Francisco Melo, ensaísta e director da Editorial Avante