2006/10/30

SAÚDE E AS TAXAS - 1º ACTO - ERA ASSIM EM 2004

Oposição Rejeita Taxas Moderadoras Diferenciadas na Saúde
Por PAULA TORRES DE CARVALHO, com B.W.
Segunda-feira, 13 de Setembro de 2004


A ideia defendida no sábado pelo primeiro-ministro, Pedro Santana Lopes, de adoptar diferentes taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde (SNS) está a ser fortemente contestada pelos partidos da oposição.
Os três candidatos à liderança do PS são unânimes em discordar da aplicação desta medida. Para Manuel Alegre, defender que "aqueles que têm mais poder económico devem pagar a taxa moderadora que corresponde aos seus rendimentos" é inconstitucional. Durante um debate na TSF, Alegre considerou que a ideia de concretizar esta medida "põe em causa o princípio da universalidade, o que é inconstitucional". Por outro lado, acrescentou, "agrava a injustiça fiscal". "Normalmente, quem paga mais impostos são aqueles que trabalham por conta de outrem - e também já dão mais dinheiro para a prestação dos serviços públicos de saúde", afirmou.
Também João Soares contestou a ideia apresentada por Pedro Santana Lopes como uma das formas de financiar o défice do SNS, calculado em mais de um bilião de euros por ano. "Não tenho nenhuma confiança neste Governo quando vem propor medidas que abrem a porta para que os serviços de saúde passem a ser pagos. Porque aquilo que eu tenho visto é este Governo, que é uma continuação do anterior, tomar sempre posição a favor daqueles que menos precisam e em prejuízo daqueles mais precisam. E essa é que é a questão central para mim", disse na TSF.
"Discordo profundamente", afirmou, por seu turno, José Sócrates. "O que o primeiro-ministro anunciou não são taxas moderadoras diferenciadas mas um aumento das taxas moderadoras", considerou... E concretizou: "Na prática, é um novo imposto sobre a saúde, o que me parece muito errado e um motivo de grande discordância". Para Sócrates, se o primeiro-ministro quer aumentar as receitas, tem "uma forma fácil de o fazer, que é combater a fraude e a evasão fiscal", em vez de "lançar um novo imposto sobre a saúde".
A estas críticas junta-se a do Bloco de Esquerda. "Assim se retoma, mais uma vez, a política de agressividade social do anterior Governo", disse ao PÚBLICO João Teixeira Lopes. "Traduz-se num ataque à universalidade dos serviços de saúde" e é "um incentivo para que a um pagamento diferenciado corresponda um tratamento diferenciado", o que, em sua opinião, é "absolutamente inconstitucional".
Para Bernardino Soares, do PCP, o anúncio desta ideia é uma forma de "disfarçar o mais que previsível aumento das taxas moderadoras", disse ao PÚBLICO. "O SNS não tem de recolher receitas próprias", nota, frisando que o que se iria repetir no sector da saúde seria a "injustiça que já existe no sistema fiscal", o que se traduziria no pagamento, por parte da maioria da população que trabalha por conta de outrem, de "uma taxa acrescida dos cuidados de saúde".
Também Manuel Delgado, presidente da Associação dos Administradores Hospitalares, já se manifestou discordante quanto ao pagamento de taxas diferenciadas em função dos rendimentos. Entrevistado pela TSF, defendeu que as taxas moderadoras "fazem sentido para moderar o consumo de cuidados de saúde", não para "autofinanciar o sistema". Por outro lado, notou que "os cidadãos devem pagar a saúde quando, em princípio, estão saudáveis e não quando adoecem", o que constitui "o bom princípio do financiamento da saúde".

Na sua opinião, "quem tem mais rendimento, em princípio, paga mais impostos. E, portanto, financia não só a saúde como a educação e outros sistemas públicos". Na perspectiva de Delgado, se esta medida for aplicada, verificar-se-á uma "dupla tributação injusta". O resultado é que vão ser "os cidadãos que estão em maior situação de dificuldade, que são os doentes e os mais idosos, a contribuir mais para o sistema de saúde quando já pagam provavelmente mais impostos, porque são aqueles que têm a obrigação de declarar os seus rendimentos".

Esta medida também não se revelará de grande importância nem para o bom funcionamento nem para o orçamento dos hospitais, sustenta Manuel Delgado. "Quando o senhor primeiro-ministro vem dizer que as receitas próprias são poucas, o que está em causa não é uma taxa moderadora para melhorar o consumo. O que está em causa é o desejo de financiamento por parte dos doentes, e isto é que é grave", considera o presidente da Associação dos Administradores Hospitalares.

Ouvida ontem pelo PÚBLICO, uma fonte do MInistério da Saúde (MS) explicou que as taxas só poderão ser aplicadas depois da criação do novo cartão de utente do serviço de saúde. A ideia apresentada por Santana Lopes no sábado não é nova, sublinhou a mesma fonte, uma vez que já estava prevista no programa do Governo e está em fase de estudo.

As novas taxas, que prevêm que os utilizadores do SNS paguem consoante os seus rendimentos, só podem entrar em vigor depois de os ministérios da Saúde e das Finanças definirem os escalões (com base nos rendimentos declarados pelos contribuintes). Como a criação de um novo cartão de utente está previsto para o próximo ano, só nessa altura é que as taxas poderão entrar em vigor.

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